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domingo, 29 de março de 2020

O NEOLIBERALISMO E A COVID-19, O QUE AMBOS TÊM EM COMUM?

Ari do Rego dos Santos
Licenciado em Geografia, professor da rede estadual de ensino do Piauí, funcionário público municipal e aluno do curso de Licenciatura em Química.


Nos anos de 1346 e 1353 aconteceu o auge da pandemia da Peste negra, também conhecida como Morte negra que segundo a história, vitimou um terço da população existente na época. Entre os anos de 1918 e 1920, outra pandemia, a gripe espanhola matou milhões no mundo, aquela que ficou conhecida como a maior pandemia da história. No Brasil foram milhares de óbitos por causa dessa gripe. Já no século XXI, mais precisamente no ano de 2009 surge no México um vírus influenza, a gripe suína que vitimou centenas de milhares de pessoas pelo mundo. Essas são algumas das grandes pandemias que ocorreram antes da atual pandemia do coronavírus (COVID-19).
E o que essas pandemias têm em comum com a COVID-19? Além dos doentes e das mortes, apesar de em números diferentes, os transtornos sociais, sanitários, políticos e econômicos. E este último tem causado no governo brasileiro e em uma parte significativa da população, um pânico grande ou até maior do que o pânico causado pelo o avanço da circulação do vírus, em grande parte provocado pela pressão de setores da economia com ameaças de fechamentos de empresas, o que ocasionaria desemprego em massa. É o mercado buscando obrigar o Estado a intervir na economia, já que estamos ou nos aproximamos de uma crise econômica mundial. É o mercado neoliberal agindo. Isso no Brasil e no mundo.
Porque, desde o surgimento da doutrina conhecida como liberalismo econômico, em momentos de crise é sempre o Estado que têm que intervir na economia para que esta se recupere e todo o sistema econômico não entre em colapso. E ele tem feito isso ao longo da história.
Ao longo do século XVIII, o absolutismo e o mercantilismo, sistemas políticos e econômicos respectivamente, começaram a entrar em crise por causa do avanço dos ideais disseminados por alguns intelectuais que ficaram conhecidos como iluministas. Ideais estes, centrados na autonomia da economia em relação à sua própria sobrevivência e regulação. E dentre os teóricos desse novo pensamento, destacou-se as ideias de Adam Smith autor do livro A Riqueza das Nações” considerado um marco na fundamentação teórica do liberalismo econômico, doutrina que defendia o livre mercado, a especialização do trabalho, a lei da oferta e da procura, maior liberdade para a iniciativa privada e a não intervenção intensa na economia por parte do Estado, sendo que o mesmo deveria funcionar mais como um assistente da mesma com o provimento das infraestruturas para o seu funcionamento e seu interventor proeminente em épocas de eventuais crises.
Na década de 1920, com o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), os Estados Unidos se consolidava como a maior economia do mundo. Com o crescimento próspero no pós-guerra, a economia americana criou nos americanos uma enorme euforia econômica, fazendo com que houvesse uma superprodução, especulação financeira e a consolidação de um estilo consumista que não foi acompanhado do aumento salarial da classe trabalhadora. E isso depois começou a trazer problemas, já que o país naquele momento era responsável por quase metade do que era produzido no mundo. Então, os baixos salários não permitiram a absorção da grande quantidade de mercadorias que eram produzidas e o resto mundo, também não tinha condições de fazer isso, pois estava ainda em recuperação dos efeitos da guerra. O que abalou o otimismo de grande parte dos que tinham ações das empresas americanas, levando a uma onda de venda dessas ações o que resultou na chamada Crise de 1929 (Quebra da bolsa de Nova York), também conhecida como Grande Depressão que foi responsável por uma grande recessão econômica que atingiu o capitalismo internacional e inaugurou a decadência do liberalismo econômico naquela ocasião.
Mas mesmo em decadência momentânea, um de seus princípios foi posto em prática com a intervenção do Estado na economia por meio do New Deal que foi um plano econômico focado no controle da emissão de valores monetários, investimentos em setores estratégicos da indústria americana e em medidas para a geração de empregos, buscando assim, a recuperação econômica do país e do mundo, nos anos de 1933 e 1937, no governo do então presidente Franklin Delano Roosevelt.
Mas essa intervenção não foi suficiente para resolver totalmente toda a instabilidade econômica daquele período e a própria economia americana continuou em crise por mais alguns anos e a de muitos países recém-arrasados pela guerra, também continuaram em declínio e muitas até faliram. E isso, somado à ascensão do totalitarismo em alguns países e o sentimento de revanche da Alemanha naquela altura, já nazista, por ter sido derrotada na Primeira Guerra, resultou na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e outra vez a Europa estava em caos econômico.
E novamente o Estado foi apelado a intervir na economia. O que ocorreu por via do Plano Marshall que foi um grande programa de ajuda econômica dos Estados Unidos para os países da Europa Ocidental, devastados pela Segunda Guerra Mundial e objetivava a reconstrução predial, da indústria e da economia dos mesmos.
Ainda dentro desse contexto de recuperação econômica mundial e da falência do modelo econômico liberal, teve início na década de 70, a crise do petróleo que foi originada pelo o alvoroço causado pela descoberta de que ele era uma fonte de energia finita. Pois, o petróleo naquele momento já era o combustível motriz do novo modelo industrial e artigo de orientação da geopolítica mundial.
E em resposta a essa crise e a toda essa situação de caos econômico que perdurava, principalmente nos países envolvidos e nos afetados pela as duas guerras mundiais, foi implantado por governos de vários países, no final da década de 70 e início dos anos 80, medidas liberais para a recuperação de suas economias, como fez Margaret Thatcher que foi Primeira-Ministra do Reino Unido nos anos de 1979 a 1990 e conduziu um audacioso programa de privatizações no território britânico inaugurando assim, o Neoliberalismo, doutrina que além de ter os mesmos princípios do Liberalismo, já citados anteriormente, também preconizava o desaparelhamento do Estado e um distanciamento maior deste, na economia, haja vista, que com a crise de 1929 o Estado voltou a ter novamente mais controle da mesma.
Margaret Thatcher foi considerada a mãe desse Neoliberalismo que apesar da ideia de novo, apresentou princípios comuns aos do Liberalismo, podendo ser considerado uma reformulação do mesmo. Ainda que trouxesse algumas novas características como: medidas contra o protecionismo econômico, abertura para a entrada de empresas multinacionais, a livre circulação do capital estrangeiro. Ou seja, sendo uma consolidação da globalização.
 E já no curso desta “nova” doutrina surge a crise de 2008, considerada a maior crise do capitalismo internacional desde a crise de 1929. Onde o crédito fácil levou à falência alguns bancos de investimentos dos Estados Unidos e levou pânico às bolsas de valores no mundo inteiro e gerou efeitos econômicos negativos que perdurou por alguns anos seguintes. E adivinha. Novamente o Estado interviu para conter a crise. Os Estados Unidos lançou um pacote bilionário de ajuda econômica naquele ano.
Então o que acontecerá agora, nesta crise econômica que se aproxima, causada pelo coronavírus?
Inevitavelmente o Estado terá que intervir na economia para que o mundo não quebre. Aliás, isso já vendo sendo anunciado e feito por alguns países. Os Estados Unidos lançou dias atrás o maior pacote de estímulo econômico da história.
O Estado brasileiro, apesar de tímido, vem intervindo na economia, atendendo ao mercado brasileiro que além de pressionar por essa intervenção, tem tentado obrigar os trabalhadores a voltarem à produção no país.
Temos acompanhado nos últimos dias, várias manifestações de grandes e conhecidos empresários brasileiros, tentando relativizar os efeitos da COVID-19 e procurando criar pânico em relação à catástrofe, segundo eles, da economia nacional.
Alguns chegando até levantar a hipótese de desempregar milhares de pessoas.  
Tudo pressão. É apenas uma forma de pressionar o Estado a crescer em termo de líder operacionalizador das soluções econômicas para o momento. Sempre foi assim, em épocas de bonanças econômicas, menos Estado e em época de crise, mais Estado.
Hora, pensem comigo. Se estivessem mesmo preocupados com o desemprego da população, teriam feito alguma coisa pelo os quase 12 milhões de desempregados que tinha no país antes da entrada desse vírus.
E não fizeram por quê? Porque como tinha milhares de pessoas trabalhando, crescendo o capital de seus “donos”, os desempregados representavam a sobra do sistema e, portanto sem importância.
Mas agora é diferente. Uma parte significativa dos trabalhadores está parada e os donos do capital se veem na eminência da redução de suas fortunas e é isso que os incomoda. E pressionam porque sabe que o desemprego, além de causar instabilidade econômica, causa também, instabilidade política, o medo número 1 do governo.
       Sabemos também que o desemprego em massa não é ruim somente para a classe trabalhadora, para os mais pobres, mas também para os empresários e para toda a economia. Já que sem dinheiro circulando, diminuirá a produção que diminuirá o capital dos operacionalizadores do sistema. Enfim todo mundo quebra.
Por isso o que vai acontecer é que o Estado vai ter que injetar dinheiro na economia e cumprir com o seu papel na economia neoliberal.
     E diante disso, nos resta fazer uma pergunta: Não seria hora do surgimento de um novo neoliberalismo mais humano e menos apegado ao lucro e que acima de tudo, em tempos de crise, sejam as saídas conduzidas pelo o próprio mercado? Mercado esse que quando a economia vai bem, é quem colhe os melhores e suculentos frutos dessa grande engrenagem formada pelo capital e milhares de trabalhadores que vendem e a um preço baixo, sua força de trabalho.
Fica a expectativa de que quem sabe, algum grande líder mundial a exemplo de Margaret Thatcher, e juntamente com os donos do capital atual, possa pensar e implantar uma nova doutrina econômica menos “predadora” da massa trabalhadora e das economias nacionais. Onde o mercado possa, em tempos de crise, como agora, prestar serviços, produzir e comercializar apenas pelo o custo dos insumos e da produção, ajudando a população de modo geral e à economia dos países, garantindo os postos de trabalho e deixando por alguns meses, de lado, o lucro.
E só para constar, não sou anticapitalista. Apenas gosto de questionar algumas das desvirtuosidades praticadas por alguns capitalistas oportunistas e aproveitadores.      
E voltando à pergunta geradora dessa discussão: O que o Neoliberalismo tem em comum com a COVID-19? A COVID-19 está causando uma crise econômica mundial e o Neoliberalismo por meio do Estado, está sendo convocado para resolver os efeitos da crise ou pelo menos para amenizá-los.